quarta-feira, 28 de dezembro de 2016

jocasta

Eu parei de correr ao sentir o primeiro raio de luz do amanhecer. As chuvas da noite sessaram e hoje eu sei que é um novo dia. 
Que doce é o sonho que tenho com você ainda viva, andando em gramados verdejantes nos meses outonais. Você andava descalça e olhava fixamente em meus olhos do outro lado dos montes Urais.
O frio da manhã me acalma e o calor da sua pele já me foi esquecida. O vermelho vivo se solidificou em pequenas gotas de gelo e sangue sobre o tampo de mármore. 
A garrafa já está seca e eu sinto que ficar sóbrio me dói na alma, e isto me mantém paralisado de medo. Eu não vou ficar mais esperando, não vou mais dormir para lembrar de sua pele macia e alva tocando em meu corpo teso.
Um dia e tudo mudou.
Uma noite e tudo terminou.
A crianças se foram com o som do primeiro tiro.
E agora não adianta mais respirar o ar do seu pulmão.
Amar é um gesto solitário. Não espero retribuição, você sabe... eu apenas me doei, pois este é o desígnio do Altíssimo.
Minha sina, meu fardo, minha história, é esta: ser o herói de todos, o salvador de poucos.
Eu sempre soube, minha vida é quebrar muros, construir caminhos, amar sem receber, erguer os que que necessitam sobre meus ombros, para que assim eles vejam o mundo que estão perdendo.
Assim é a vida ao viver no país de Deus e da minha justiça.
Você morreu e eu sepultei seu corpo no cemitério mais bonito. Dancei no fogo e renasci das cinzas de meu inferno interior. Devorei meu demônio intestino e ressurgi mais forte e confiante.
Estou pronto para buscar seu cadáver de baixo da terra.
Comerei sua carne e reconstruirei seu ser finito.
Você será remontada, religada, formatada conforme meu desenho da perfeição eterna. Visão moderna de um novo Prometeu feminino.
Pele e Kevlar costurados.
Ossos metálicos.
Músculos sintéticos.
Hoje serás minha criação perfeita.
Viveremos na eternidade.